Eu gostava quando os relógios se estragavam. Os de pulso, que eram aqueles que nos mediam os medos e a pulsação acelerava ou os sonhos, e eles, os relógios de sonho, paravam, perplexos, sem saber como continuar o tempo. E dávamos-lhes corda até quebrar. 
Depois íamos à ourivesaria Vilamar e o senhor Mendonça perguntava, então o que foi? não sabemos, respondíamos, porque apenas ele sabia. Era o deus das pequenas coisas o senhor Mendonça. Grande, era aquele olho que nos olhava quando ele levantava a cabeça do relógio partido e dizia feliz, vai dar muito trabalho mas tem arranjo.


sem nome IV, de Antonio Grambone